No dia 23 de setembro de 2018, o programa “DOMINGO ESPETACULAR” da Rede Record da televisão exibiu uma reportagem intitulada de “Quem se arrependeu de mudar de sexo?”. Nesta mesma matéria foram proferidas inúmeras discriminações sobre a população de “transgêneros” com opiniões equivocadas e principalmente se referenciando a autores americanos que estão em desuso na bibliografia para estudos sobre a cirurgia de redesignação sexual. A matéria em questão colhe entrevistas tendenciosas de profissionais que utilizam o termo “IDEOLOGIA DE GÊNERO” como forma de inferiorizar as pessoas que fazem o acompanhamento para readequação sexual que foi mencionado como “mudança de sexo” e de maneira pejorativa. Primeiramente, gostaríamos de esclarecer o que seria essa “Ideologia” citada na reportagem em questão. A crítica se refere a um programa do Governo Federal chamado: Brasil sem Homofobia – Programa de Combate à Violência e à Discriminação contra LGBT e de Promoção da Cidadania LGBT, lançado no ano de 2004.
Cabe ainda esclarecer e reforçar que não queremos impor nada à sociedade, conforme foi citado pelo programa, mas queremos sim que a sociedade brasileira compreenda e reconheça a existência da diversidade humana, já que, também somos cidadãos e cidadãs que tem o direito fundamental de não sermos discriminados, tanto quanto qualquer outra pessoa. A Constituição Federal declara “todos são iguais perante a lei” (art. 5º caput), no entanto, a desigualdade social e discriminação de pessoas trans e travestis é histórica, e ainda faz parte da atual realidade brasileira, por isso, exige medidas compensatórias e ações afirmativas como está para garantir o mínimo de direitos para essa população, que é a mais assassinada no Brasil, segundo os dados de nosso monitoramento. O que evidencia que nossa população de pessoas trans e travestis está sendo direta e constantemente perseguida e atacada pela sociedade, vítimas de crimes transfóbicos.
Segundo Joaquim Barbosa (2001), entende-se por Ações Afirmativas,“um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vista ao combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de direitos fundamentais como o respeito e o direito à vida.” (p. 40). É inaceitável a falta de empatia da RecordTV diante desse dado alarmante, e veicular esse tipo de reportagem de cunho tendencioso, discriminatório e excludente que estimula o preconceito sobre as conquistas dos direitos da redesignação sexual e, principalmente, da retificação do registro civil de pessoas trans e travestis, e ainda nos tratando como pessoas infelizes e culpando nossas identidades de gênero como causadora de transtornos.
Enquanto emissora de TV e de grande alcance de espectadores, a emissora presta um total desserviço à sociedade no sentido de reforçar uma imagem já muito estigmatizada e patologizada desta população. Não cabe mais uma das maiores emissoras de TV aberta brasileira, que tem a admiração e o respeito da sociedade em geral, seja palco para um show de sensacionalismo e ataques infundados e desrespeitosos contra pessoas trans. Não tendo consultado sequer nenhum profissional dos centros cirúrgicos autorizados a fazerem esse procedimento no país para que eles falassem sobre o assunto, e mais, utilizaram dois personagens que fizeram cirurgias fora do Brasil como exemplo de arrependimento.
Enquanto instituição que luta pela cidadania dessa população, nos fazemos o seguinte questionamento: Onde estão os personagens que melhoraram suas vidas completamente após a cirurgia e por que não aparecem na matéria? Reforçar os estereótipos e as opiniões preconceituosas só aumentam as violências contra essas pessoas, levando-as à exclusão social, e principalmente, a violência diária sofrida por elas em diversas esferas da sociedade.
Diante disso, a Rede Trans Brasil manifesta seu repudio a reportagens pejorativas como essa, assim como também rejeitamos esse tipo de jornalismo. Portanto, solicitamos como retratação uma versão contrária destes fatos, em que mais de 90 % desta população se sente satisfeita com a cirurgia e retificação de registro civil.
A Rede e a sociedade não podem ficar caladas diante a essa injustiça. É preciso que o Brasil e os brasileiros não só enxerguem e reconheçam a importância da nossa população na sociedade, como também respeitem a nossa existência, nossas vivências e nosso direito à liberdade prevista pela constituição, inclusive a de gênero. Violação ou discriminação essa que deve ser punida segundo a Constituição Federal (art. 5º, inc. XLI).
Com a responsabilidade que lhe cabe, a Rede Trans Brasil vem a público reforçar o compromisso de seus associados em defesa dos seus direitos fundamentais, combate à discriminação e à violência contra a população de pessoas trans e travesti
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Nota de Repudio_Rede Trans Brasil a RecordTv
Tathiane de Araujo de Araújo
Presidente da Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil